Entenda o que é marco temporal; STF deve retomar julgamento na próxima semana

O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre demarcação de terras indígenas foi suspenso em 2021 e será retomado em 7 de junho

Mylena Lira   Publicado em 30/05/2023, às 18h37

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Na última quarta-feira (25), a Câmara dos Deputados aprovou o regime de urgência para a tramitação do Projeto de Lei 490, que propõe a aplicação do marco temporal na demarcação de terras indígenas. O projeto, que está em tramitação desde 2007, tem causado impacto direto nos processos de demarcação e busca conferir ao Legislativo a palavra final sobre o tema.

Um dos principais argumentos presentes no texto do projeto é o marco temporal, defendido por produtores rurais, que sustenta que apenas as comunidades indígenas que estavam em posse dos territórios na promulgação da Constituição de 1988 teriam direito às terras. Esse argumento é criticado por diversos especialistas, que apontam a expulsão histórica dos indígenas de seus territórios.

Com a aprovação do regime de urgência, o texto do Projeto de Lei 490 começou a ser analisado no plenário da Câmara nesta terça-feira (30). Caso seja aprovado, seguirá para análise no Senado e, se obtiver aval da Casa, será encaminhado para sanção presidencial.

A pressa dos parlamentares em aprovar o projeto antes do julgamento do Supremo Tribunal Federal, marcado para o dia 7 de junho, é vista como uma forma de antecipar a posição do Congresso em relação ao tema. O senador Zequinha Marinho (PL-PA), vice-presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária, afirmou que o Congresso está trazendo o debate e um novo julgamento para aumentar o território indígena.

Críticas ao marco temporal

No entanto, para a Defensoria Pública da União, toda essa pressa não se justifica. O órgão questiona a legalidade do projeto e da tese do marco temporal, alegando que o projeto é inconstitucional, não está em conformidade com os tratados internacionais firmados pelo Brasil e não considerou a consulta aos povos indígenas.

A proposta também tem gerado forte reação por parte dos povos indígenas e de organizações de defesa dos direitos humanos. Nesta terça-feira (30), servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) realizaram uma vigília em protesto ao PL 490/2007, reivindicando também a aprovação do plano de carreira do quadro da autarquia. O ato aconteceu no Anexo II da Câmara dos Deputados e contou com o apoio de entidades como Indigenistas Associados (INA), Sindisep-DF e CUT.

Os indígenas também têm se mobilizado contra o projeto. Os Guaranis da Terra Indígena Jaraguá, em São Paulo, bloquearam a Rodovia dos Bandeirantes, sentido São Paulo, como forma de protesto contra a votação do PL 490/2007. Ontem (29), eles realizaram atos no Largo São Francisco, região central da cidade, e iniciaram uma vigília na Terra Indígena Jaraguá. Novas manifestações estão previstas em todo o país.

A preocupação com projetos que afetam as causas indígenas também foi manifestada pelo escritório da Organização das Nações Unidas (ONU) para Direitos Humanos na América do Sul. A ONU cobrou as autoridades brasileiras a tomarem medidas urgentes em prol dessas populações, em conformidade com as normas internacionais de direitos humanos.

Diversas instituições, como a Human Rights Watch, o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs e a Aliança Cristã Evangélica, também demonstraram preocupação com a aprovação do projeto, alegando que ele poderia enfraquecer a proteção dos povos indígenas no Brasil.

Saiba mais sobre o marco temporal

Marco temporal é uma tese jurídica que estabelece que os povos indígenas têm direito apenas às terras que ocupavam ou disputavam até o dia 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição. Essa tese ganhou destaque em 2009, quando foi utilizada em um parecer da Advocacia-Geral da União para a demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima.

Um exemplo atual que ilustra a aplicação do marco temporal é a disputa em torno da Terra Indígena Ibirama-Laklãnõ. Parte dessa terra, ocupada pelos indígenas Xokleng e objeto de disputa com agricultores, está sendo requerida pelo governo de Santa Catarina no Supremo Tribunal Federal (STF). O argumento apresentado é de que essa área, que abrange aproximadamente 80 mil m², não estava ocupada em 5 de outubro de 1988.

Os Xokleng, por sua vez, argumentam que a terra estava desocupada na época devido à expulsão deles. A decisão do STF sobre esse caso terá um impacto significativo, pois estabelecerá o entendimento do tribunal em relação à validade ou não do marco temporal em todo o país. O julgamento está previsto para ocorrer em 7 de junho. Mais de 80 casos semelhantes e mais de 300 processos de demarcação de terras indígenas aguardam uma definição.

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