Condenado por tráfico de drogas passa em Concurso Público NA PRISÃO

Mesmo condenado em regime fechado, o candidato foi aprovado em vestibular para Direito, em dois concursos de estágio e, por fim, em dois concursos públicos. STF autorizou a posse

Mylena Lira   Publicado em 04/10/2023, às 20h38

Divulgação

Nesta quarta-feira (4), o Supremo Tribunal Federal (STF) proferiu uma decisão histórica ao autorizar a posse de um homem condenado por tráfico de drogas, em regime fechado, em um cargo público na Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). O caso ganhou notoriedade por ele ter passado no concurso público enquanto estava preso.

O candidato, cuja identidade não foi revelada, obteve a liberdade condicional, concedida pelo juiz da Vara de Execuções Penais, justamente para assumir o cargo de auxiliar de indigenismo na Funai. No entanto, sua posse foi inicialmente impedida pela Funai devido à falta do recibo de quitação eleitoral, um dos requisitos do concurso público.

O ministro Alexande de Moraes, relator do caso no STF, enfatizou a notável conquista do condenado. Ele salientou que, mesmo condenado em regime fechado por tráfico de drogas, o candidato havia sido aprovado em vestibular para Direito, em dois concursos de estágio e, por fim, em dois concursos públicos.

Após o feito, obteve a liberdade condicional, para que pudesse ser investido no cargo público e se reintegrar à sociedade. Quanto à falta de quitação com a Justiça Eleitoral, o relator lembrou que foi em decorrência da pena que ele cumpria, não de vontade própria.

Moraes destacou ainda a peculiaridade do caso concreto, que reforçou seu entendimento. “Em regime fechado ele estava, sabemos, todos, as condições dos presídios. [Imaginem] a força de vontade que deve ter tido esse condenado em passar num vestibular, em dois concursos de estágios, em dois concursos públicos”.

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Saiba mais sobre o caso

Representado pela Defensoria Pública, o candidato argumentou que não pôde regularizar sua situação eleitoral enquanto estava preso, pois não teve a oportunidade de votar. Além disso, a defesa destacou que a participação em concursos públicos é um direito dos apenados e que exigências que não considerem a privação da liberdade seriam discriminatórias.

A primeira instância rejeitou o caso, mas na segunda instância o homem teve reconhecido o direito de tomar posse. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) afirmou que a execução penal visa proporcionar condições para a reintegração social do condenado e que impedir seu acesso ao cargo seria contraproducente.

A Funai, então, recorreu ao STF, alegando o princípio da isonomia e argumentando que a Constituição prevê a suspensão dos direitos políticos durante a condenação, mesmo em liberdade condicional. Além disso, o gozo de direitos políticos é um dos requisitos para investidura em cargo público previstos no artigo 5° do Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis (Lei 8.112/​1990).

No julgamento, a maioria dos ministros do STF afastou a necessidade da quitação eleitoral para a nomeação e posse de candidatos presos aprovados em concurso público. A tese final ressaltou o respeito à dignidade humana e ao valor social do trabalho como fundamentos para a decisão.

O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, explicou que a suspensão dos direitos políticos não se estende a outros direitos civis e sociais, como o direito ao trabalho. “O que a Constituição Federal estabelece é a suspensão do direito de votar e de ser votado, e não do direito a trabalhar”, assinalou, ressaltando que a ressocialização dos presos no Brasil é um desafio que só pode ser enfrentado com estudo e trabalho.

O relator foi seguido pelos ministros:

Cristiano Zanin votou contra a posse de condenados aprovados em processos seletivos. O ministro Nunes Marques se declarou impedido, por já ter julgado o caso quando era desembargador do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. O decano da Corte, Gilmar Mendes, não participou.

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Tese fixada

A tese de repercussão fixada no julgamento estabelece que a suspensão dos direitos políticos não impede a nomeação e posse de candidatos aprovados em concurso público, desde que não incompatível com a infração penal praticada, em respeito à dignidade da pessoa humana e ao valor social do trabalho. O início do exercício do cargo ficará condicionado ao regime da pena ou à decisão judicial do Juízo de Execuções.

A decisão, que destaca a importância da ressocialização de apenados, tem repercussão geral e servirá de referência para casos semelhantes no Brasil. Este caso emblemático abre portas para que outros apenados tenham a oportunidade de se reintegrar à sociedade por meio do trabalho no serviço público.

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